HISTÓRIA EM QUADRINHOS COMO RECURSO DIDÁTICO NAS AULAS DE HISTÓRIA: possibilidades e limites.






Autoras: Indira Vitória Gomes Da Silva Gama 
indiravit@hotmail.com
Maria Clara Lima de Oliveira 
mariaclaralima0923@gmail.com
Orientadora:Vilmar Aires dos Santos 
vlmarairessantos@gmail.com


RESUMO

O presente artigo resulta de investigação sobre o ensino de história na educação básica, no âmbito do Programa Residência Pedagógica (RP) e tem como objeto de investigação histórias em quadrinhos como recurso didático nas aulas de História. A questão central do estudo é a seguinte indagação: quais as potencialidades do uso das Histórias em Quadrinhos (HQs) no ensino de história na educação básica? Nessa perspectiva, o objetivo geral é: investigar como os HQs podem ser utilizados como recursos didáticos inovadores para o ensino de história. Delineamos como objetivos específicos: explicitar como os quadrinhos vem sendo trabalhado como recurso didático; explicar como uma literatura educacional aborda a temática dos quadrinhos na educação; caracterizar a concepção do docente pesquisado e discentes sobre o uso de quadrinhos como recurso didático no ensino de história; sugerir estratégias para se trabalhar com HQs no ensino de história. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica e de campo na qual dialogamos com autores, como: Neves, 2012; Nogueira, 2005; Palhares, 2009; Pessoa, 2006; Tanino, 2011; Vergueiro, 2009; Vilela, 2012; Lima, 2017; Santos, Vergueiro, 2012, dentre outros.  A metodologia utilizada foi do tipo qualitativo, através de estudo de caso com intuito de descrever e explicar os limites e possibilidades para se trabalhar com os quadrinhos. Na pesquisa de campo, o contexto da investigação foi uma sala de aula, do ensino médio, de escola de nível médio situada na zona leste de Teresina. Os sujeitos colaboradores foram o docente e discentes de uma turma de 1º ano. O instrumento de recolha de dados foi uma entrevista semiestruturada, com o docente e questionamentos informais com os discentes. A análise de dados ocorreu tendo por base a análise de conteúdo (BARDIN, 1977) que busca desvelar os significados das falas dos sujeitos. 

Palavras-Chave: Ensino de História. Recurso Didático. História em Quadrinhos.

SUMMARY

This article results from research on the teaching of history in basic education, within the scope of the Pedagogical Residence Program (PR) and has as its object of investigation comics as didactic resource in history classes. The main question of the study is the following question: : What are the potentialities of using comic books (comic books) to teach history in basic education? From this perspective, the overall goal is to investigate how comic books can be used as innovative didactic resources for teaching history. We outline as specific objectives: to explain how the comic has been worked as a didactic resource; explain how an educational literature approaches the theme of comics in education, characterize the conception of the researched teacher and students about the use of comics as a didactic resource in the teaching of history; suggest strategies for working with comic books in the teaching of history. This is a bibliographic and field research in which we dialogue with authors, such as: Neves, 2012; Nogueira, 2005; Palhares, 2009; Pessoa, 2006; Tanino, 2011; Vergueiro, 2009; Vilela, 2012; Lima, 2017; Santos, Vergueiro, 2012, among others. The methodology used was qualitative, through a case study in order to describe and explain the u and possibilities to work with comics. In the field research, the context of the investigation was a high school, high school classroom located in the east of Teresina. The collaborating subjects were odocente and students of a class of 1st year. The data collection instrument was a semi-structured interview with the teacher and informal questions with the students. Data analysis was based on content analysis (BARDIN, 1977) that seeks to unveil the meanings of the subjects' statements.

Keywords: History Teaching. Didactic resource. Comic.

1. Introdução.

A escolha do estudo sobre Histórias em Quadrinhos (HQs), como recurso didático em aulas de história, ganhou impulso quando cursamos a disciplina de História, Arte e cultura, que trouxe em discussão os quadrinhos como possibilidade de uso como ferramenta pedagógica e, na constatação de que esse pode ser um dispositivo importante nas aulas de história, tendo em vista que trabalham imagens e textos, de forma atrativa e lúdica.

Buscamos, através dessa investigação, compreender as possibilidades e limites de se empregar os quadrinhos como recurso didático no ambiente escolar para melhoria do ensino aprendizagem. O uso dessa ferramenta pode conceber o aluno como sujeito participante na construção do conhecimento e de seu próprio aprendizado. A ideia de vincular o recurso das HQs ao ensino de história se materializou através do estudo de uma temática da história, em que se fez uso dessa ferramenta aliando-a ao texto do livro didático, em turma de ensino médio. 

A relevância do tema se insere no que assegura a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, quando afirma que ao final do ensino médio o aluno deve ser capaz de conhecer novas formas contemporâneas de linguagem. (BRASIL, 1996). Por se tratar de leitura presente no cotidiano dos adolescentes, as HQs se configuram como recurso de fácil acesso, atrativo e que pode colaborar, de maneira eficaz e construtiva para potencializar o ensino e aprendizagem da disciplina de história.

Nesse sentido, a questão norteadora do estudo foi formulada da seguinte forma: quais as potencialidades do uso das Histórias em Quadrinhos (HQs) no ensino de história na educação básica? A partir daí foram delineados como objetivo geral: investigar como as HQs podem ser utilizadas como recursos didáticos inovadores para o ensino de história, e, de forma específica, buscamos explicitar como os quadrinhos vem sendo trabalhados como recurso didático; explicar como uma literatura educacional aborda a temática dos quadrinhos na educação; caracterizar a concepção do docente colaborador e discentes sobre o uso de quadrinhos como recurso didático no ensino de história e sugerir estratégias para se trabalhar com HQs no ensino de história.

A fundamentação teórica do estudo foi buscada em: Neves (2012), que em trabalho de conclusão de curso aborda a “História em quadrinhos como recurso didático em sala de aula”; Nogueira (2005), que publica no Simpósio Nacional de História  da ANPUH, artigo intitulado “Aprendendo história através das HQS: experiências e considerações”; Palhares (2009), que discute as histórias em quadrinhos enquanto ferramenta pedagógica para o ensino de história; Pessoa (2006), defende dissertação de mestrado em que pesquisa sobre os Quadrinhos como uma proposta didática na educação básica; Tanino (2011), em trabalho de conclusão de curso na área de Pedagogia discute as “Histórias em quadrinhos como recurso metodológico para os processos de ensinar”; Vergueiro (2009), faz importante articulação entre “Quadrinhos e educação popular no Brasil”; Vilela, (2012), defende dissertação enfatizando “A utilização dos quadrinhos no ensino de história”; Lima (2017), traz estudo sobre as histórias em quadrinhos e o ensino de história; Santos; Vergueiro (2012), que propõe o uso de histórias em quadrinhos no processo de aprendizado, numa abordagem teórico-prática, Mccloud (2005), em seu livro “Desvendado os Quadrinhos” utiliza a linguagem específica dos quadrinhos destacando seu aspecto artístico e funcionalidade, aborda também a influência da percepção temporal nas histórias., dentre outros estudos sobre a temática.

O exame da fundamentação teórica sobre o assunto indica que, apesar de a quantidade de estudos na área ainda ser relativamente pequeno, as pesquisas apontam no sentido de que essa é uma temática em expansão e que por sua possibilidade de se tornar recurso didático utilizado por diversas áreas do conhecimento, os estudos sobre as HQs têm potencialidade para se disseminar cada vez mais e contribuir de forma significativa no processo de ensino aprendizagem da história e de outras disciplinas.

O artigo foi estruturado nas seguintes partes: introdução, mostrando a relevância do tema, os objetivos, questões norteadoras e os suportes teórico-metodológicos que fundamentaram o estudo. Primeira seção, que apresentará a fundamentação teórica do estudo, cujo título é: Estudos e pesquisas sobre as Histórias em Quadrinhos como recurso metodológico; na segunda seção, apresentou-se a aplicação das HQs na aula de história: relato de uma experiência no ensino médio; aterceira convida o leitor a entender algumas possibilidades e limites dos Quadrinhos como recuso didático nas aulas de história, e nas considerações finais, apresenta-se um apanhado dos entendimentos construídos com o estudo dessa temática.

2. Estudos e pesquisas sobre as Histórias em Quadrinhos como recurso metodológico.

As histórias em quadrinhos possuem linguagem própria, uma linguagem que tem história, modifica-se e evolui continuamente. Ela possui um universo amplo de possibilidades e um grande potencial de comunicação. A utilização desta por professores na sala de aula requer o conhecimento prévio deste tipo de linguagem, no caminho de como trabalhá-la em sala de aula para o melhor ensino e aprendizagem. É preciso ter experiência com histórias em quadrinhos, no sentido de experimentar o impacto que este tipo de leitura pode provocar em si como leitor.

A aceitação das HQs como recurso metodológico em sala de aula é algo recente, e de forma limitada em algumas áreas de ensino. Nas décadas de 1940, 1950 e 1960 especialmente, as HQs foram alvos de preconceitos de muitos educadores, não só no Brasil como em várias partes do mundo. “[...] as histórias em quadrinhos eram acusadas de serem culpadas pelo aumento da delinquência juvenil e de prejudicarem no rendimento escolar dos jovens, afastando-os dos estudos [...]” (VILELA, 2012, p.17) essa forma de pensamento foi sendo mudado cada vez mais pelos educadores e pesquisadores, ao reconhecer o potencial das histórias em quadrinhos no ensino. “[...] que em vez de prejudicar o desempenho dos jovens nos estudos, pelo contrário, poderiam tornar o aprendizado mais atraente e dinâmico [...]” (VILELA, 2012, p.18) Os educadores e pesquisadores que defendiam que as HQs poderiam ser usadas como ferramenta de ensino, começaram a receber mais atenção e menos sensacionalismo.

Mas a introdução das HQs como ferramenta de ensino, aconteceu de maneira restrita, inicialmente utilizada em livros didáticos apenas de forma ilustrativa no acompanhamento de textos complexos. O processo de ensinar e aprender são algo que acontece de maneira conjunta, os docentes utilizam diferentes técnicas pedagógicas ou metodologias de ensino no ambiente escolar, utilizar as HQs em sala de aula é uma forma de recurso pedagógico, e não há regras para sua utilização no meio educativo, cabe ao docente conhecimento e criatividade para uso deste instrumento em sala de aula. (TATINO, 2011)

É comum associar quadrinhos como um gênero literário, mas de forma simples explicando, quadrinhos são quadrinhos, no sentido de que possuem linguagem autônoma, na utilização de mecanismos próprios na representação de elementos narrativos. Apesar de haver pontos em comum com a literatura, há também com o cinema, teatro e outras linguagens. “[...] é possível definir histórias em quadrinhos como enredos narrados quadro a quadro, por meio de desenhos e textos, que utilizam o discurso direto, característico da língua falada em um gênero textual bem aceito entre os estudantes [...]” (TATINO, 2011, p.14)

As HQs no ensino estão presentes em diferentes campos do saber, no caso do ensino de História, há cada vez mais obras com temas e aspectos históricos. Desta forma é profundamente importante pesquisas sobre o uso de HQs no ensino de História. As HQs podem ser utilizadas como instrumento pedagógico, em qualquer nível de ensino, procurando adequá-los a faixa etária dos alunos.


É importante também que as HQs sejam vistas como mais um recurso a ser utilizado pelo professor para incrementar suas aulas, e não como uma “ferramenta milagrosa” que vai ajudar a tornar todas as aulas interessantes e estimulantes para todos os alunos sem exceção. Os cuidados necessários para uma boa utilização das HQs na sala de aula são praticamente os mesmos que devem ser tomados em relação ao uso do cinema na sala de aula. (VILELA, 2012, p.28)


Como alerta Vilela (2012) as HQs são apenas mais uma ferramenta de uso didático que pode ser utilizado pelo professor na sala de aula. Por isso é necessário saber utilizá-la de maneira eficaz, entendendo as limitações e que muitas vezes os resultados podem não ser alcançados como desejado. O uso das HQs no ensino e como recurso metodológico não irá resolver a crise do ensino escolar e não deve substituir o desinteresse pela palavra escrita, mas devem estar presentes no eixo das atividades escolares. Na sala de aula as HQs devem ser intermediadas pelo docente, de forma a expandir os horizontes e a visão de mundo dos discentes, melhorando a qualidade das experiências de aprendizagem.

As HQS tanto podem ser usadas como fonte documental para estudar determinado assunto ou época, como podem ser consideradas material de apoio para reflexões críticas, em sala de aula. Embora com capacidade de tornar o aprendizado mais prazeroso, crítico e dinâmico, a utilização desse recurso didático requer um compromisso do docente com um criterioso planejamento e preparo da aula, bem como o domínio do conteúdo a ser trabalhado.

Lima destaca o uso dos HQs como importante marco na ampliação da noção de fontes históricas que se faz presente a partir de movimentos historiográficos que buscam romper com a história tradicional, 

A utilização das HQs no ensino de História tem se afirmado lentamente nas últimas décadas, em especial em decorrência do movimento historiográfico de ampliação da noção de fontes e pela abertura do espaço escolar para a utilização de novas linguagens. [...]. Além disso, convém destacar que desde meados do século passado é comum encontrar histórias em quadrinhos direcionadas ao trato de eventos históricos com cunho educativo, o qual, por vezes, revela ligação profunda com o regime político em vigência no país de origem dos quadrinhos (2017, p. 153).


Para o autor, já a partir de meados do século passado podem-se encontrar histórias em quadrinho com temáticas históricas o que pode indicar a busca pela utilização de novas linguagens para o aprendizado da disciplina.

O uso das HQs como qualquer outro recurso didático deve contribuir para a formação dos discentes, na compreensão de conceitos e processos históricos que servirá de auxílio para o entendimento do mundo atual e seus problemas. A linguagem das HQs pode funcionar como mediadoras do ensino de História, essa relação dos registros escritos com os registros visuais, sempre esteve ao longo da história das civilizações, a imagem e a escrita sempre conviveram. (VILELA, 2012)

As HQs é um meio de alfabetização e de leitura saudável, alfabetizar visualmente. No ambiente escolar é interessante que o docente traga os conteúdos complexos ou não, de forma lúdica e descontraída. As HQs constituem de um instrumento que está presente no cotidiano das crianças e jovens, como uma leitura popular. E desta forma o uso delas aproxima os alunos no exercício da atividade. Mas é preciso ter cuidado para que o uso deste não se torne monótono. 

Com isso é importante ter entendimento deste tipo de linguagem, tanto do aspecto visual quanto do aspecto verbal. É importante tanto para a compreensão da história quanto para a aplicação desta em sala de aula e pesquisas científicas que envolvem este assunto, desta forma é preciso saber identificar os elementos presentes neste tipo de leitura para uma boa compreensão daquilo que se estar lendo.

Há uma imensidão de possibilidades de inserir as HQs em sala de aula, seja como mediador para o ensino, como também para atividades práticas. Por exemplo:


Desse raciocínio, é possível desenvolver três atividades práticas. A primeira é a leitura de uma história em quadrinhos para identificar sua linguagem e a disposição de seus elementos narrativos. O professor também pode retirar os textos dos balões e solicitar aos estudantes que elaborem novos diálogos, trabalhando a articulação texto-imagem. Outro exercício, que pode ser conduzido conjuntamente com docentes de Artes e de Língua Portuguesa, é a criação de histórias em quadrinhos pelos próprios alunos, utilizando cartolina ou sulfite. Individualmente ou em grupo, elessão orientados a desenvolver o argumento (tema, personagens, tempo e espaço da narrativa etc.) e o roteiro (quais ações e diálogos devem ocupar cada vinheta) da história e a fazer a arte (desenho e colorização). Ao final, pode-se organizar uma exposição dos trabalhos na escola, que, inclusive, servirá de incentivo a outros estudantes [...](SANTOS, VERGUEIRO, 2012, p.86-87)


É apenas algumas sugestões de como utilizar as HQs como ferramenta pedagógica em sala de aula, cabe também ao docente usar a criatividade e adequar a sua realidade escolar, entendendo os limites e possibilidades, aperfeiçoando e melhorando, pois não devem ser encaradas como receitas prontas e acabadas.
 
Segundo trabalho apresentado na XXIII Simpósio Nacional de História por Nogueira (2005) “[...] O estudante deve aprender a ler e aprender a trabalhar as informações que adquire através da leitura [...]” (p.2), pois, “[...] as histórias em quadrinhos possuem uma linguagem simples e de fácil compreensão para os alunos [...]”.(p.2) Sendo assim, as HQs serviriam como estimulador da leitura entre os alunos correlacionando com a compreensão da realidade social em que vivem. O período da Guerra Fria, por exemplo, demonstra a utilização e criação dos quadrinhos do Capitão América, relacionando com o contexto social da época, evidenciando a figura de um herói americano e vilão deformado russo.

O que explica o uso recorrente de quadrinhos na educação seria a geração mais jovem. Na tese de mestrado de Vilela (2012), ele afirma que “[...] parte da maior aceitação que os quadrinhos possuem hoje se deve ao fato de que um número significativo de professores da geração mais jovem teve as histórias em quadrinhos entre suas primeiras leituras [...]” (p.18) O que é natural já que quando gostamos de algo, temos tendência a fazer propagandas maravilhosas sobre isso. Ele afirma novamente que, as HQs “[...] também são uma forma de narrativa, mas predominantemente visual, embora também se utilizem textos [...]”. (2012, p.18)

Neves (2012) estabelece uma diferença entre quadrinhos produzidos com a finalidade de auxiliar o ensino de história e aqueles com finalidade comercial, mas que mesmo assim, afeta a historiografia, ressaltando ainda, a correlação de Gibis e HQs. Gibis são mais usados nos livros didáticos, é comum que apresentem uma periodicidade de circulação social, contudo, não possuem a intencionalidade educativa explicita.

Ainda para Neves (2012), em seu trabalho de conclusão de curso afirma que “[...] o aprendizado deve ocorrer a partir da interação do aluno com os conteúdos e a pratica, de modo que o aluno possa levar esses conhecimentos adquiridos e produzidos como contribuição para a melhoria da sociedade [...]” (2012, p.16)

O ambiente escolar precisa evoluir a maneira que o mundo evolui em seu espaço social, tecnologias, formas de obter conhecimento entre outros, o enquadramento escolar aprisiona e não torna o conhecimento prazeroso e por vezes sem utilidade. Trazer métodos e formatos de aula aliado a algo que estar dentro do contexto do mundo do aluno, é uma possibilidade a seguir.

Para o autor Mccloud (2005) Nossa sociedade é muito envolvida na realidade simplificada. A simplificação da imagem torna-se uma ferramenta eficaz de narrativa em qualquer meio de comunicação. Há diferentes modos e meios de ver as coisas. Há uma amplitude de nossos sentidos a medida como ampliamos nosso contato com o mundo, e isso se dá através da experiência de nossos sentidos. Mas nossos sentidos podem revelar um mundo fragmentado e incompleto, nunca temos a visão do todo apenas fragmentos, é desta forma que acontece nossa percepção da “realidade”, uma percepção que não estar lá quando você é criança, isso é aprendida a partir da idade e do contato com o mundo. 

Nos quadrinhos a separação de espaço entre os quadros dão uma ideia que logo você conclui, mesmo que não esteja explicito o ato, você supõe e conclui. Captura-se duas imagens distintas e a transforma em uma ideia. A experiência indica algo. A conclusão nos permite conectar momentos e fazer a conclusão mentalmente, como se fosse uma realidade contínua e unificada. Ela não é continua e estar longe de ser involuntária. O escritor do quadrinho partilha de um cúmplice silencioso, este é o leitor. O leitor constrói também a narrativa, participando e escolhendo o ato. Fazer o leitor utilizar sua própria imaginação. Isso é utilizado de forma recorrente nos quadrinhos. A arte nos quadrinhos é tão subtrativa quanto aditiva. (MCCLOUD, 2005)

Histórias em quadrinhos é uma forma de auto-expressão, quadrinhos é arte. Segundo o conceito de arte do Mccloud (2005), a arte é algo inerente ao ser humano, são independentes de nossos instintos evolutivos. A arte é a maneira de nos afirmamos enquanto indivíduos. E isto é bastante significativo para nossos estímulos externos, sobrevivência mental e nossa sobrevivência como espécie. A arte como descoberta. A força da arte vai depender das ideias existentes dentro dela, narrar histórias tem a ver com a propriedade da invenção. O mais importante é fazer o questionamento do que se estar querendo. E desta forma um mundo de experiências podem surgir. 

3. Aplicação das HQs na aula de história: relato de uma experiência no ensino médio.

Neste tópico será abordado a aplicação das HQs nas aulas de história, tomando como base um relato sobre a experiencia do uso da mesma em uma sala de ensino médio resultado de investigações sobre o ensino de história na educação básica, no âmbito do Programa Residência Pedagógica (RP). 

A escola em que essa prática foi aplicada está situada na zona leste de Teresina, mas especificamente no bairro Morado do Sol, sendo ela uma instituição estadual e que fornece ensino apenas a nível médio. Tomaremos como objeto de pesquisa para esse tópico a participação informal de alunos do 1° ano do ensino médio dessa escola, e também contaremos com uma entrevista semiestruturada, com o docente preceptor do Programa Residência Pedagógica deste colégio, que aqui chamaremos de Roberto Claudio.

Foi elaborado a ideia de se comentar com os alunos sobre as histórias em quadrinhos e qual seriam suas opiniões sobre elas, de forma a tomar um conhecimento breve de como a temática seria inserida e recebida em sala de aula. Segundo relatos dos alunos, alguns disseram que liam quadrinhos na infância, mas esqueceram essa prática, outros disseram que voltaram a ler quadrinhos a partir da influência dos filmes da Marvel, considerada uma das grandes editoras de histórias em quadrinhos, de forma a entender um pouco mais sobre o que se passava por trás desses filmes.

Depois dessa discursão sobre as HQs, perguntamos se eles consideravam possível ocorrer um aprendizado sobre os assuntos do próprio livro didático e se pensavam se esse instrumento de ensino seria aceito em sala de aula, houve várias exclamações a respeito, mas um ponto chave que os alunos não entendiam era como utilizar os quadrinhos como objeto que reflete o assunto estudado em livros didático.

A partir disso, começamos a pensar em como utilizar os quadrinhos de forma a produzir um aprendizado mais dinâmico para esses alunos. Iniciamos em sala, uma breve explicação sobre o surgimento das HQs, desde sua origem até as formas que eram escritas, publicadas e quando elas conseguiram certo reconhecimento mundial, retratando também como as histórias em quadrinhos passaram a não ser apenas um passatempo infantil, mesclando-se com a literatura que quebra barreiras de idade, utilizando como exemplo, os quadrinhos de super-heróis, sendo estes os mais conhecidos pelos estudantes dessa turma.

Para contextualizar o uso das histórias em quadrinhos no ensino de história, utilizamos como base o assunto que estava sendo ensinado em sala, que seria sobre a História da África, foi explanado o assunto de forma normalmente repassada aos alunos, seguido sobre uma discursão mais aprofundada sobre o assunto, saindo um pouco do eixo do livro didático e adentrando em leituras complementares. Dessa forma, passamos a discutir quadrinhos que retratam personagens inseridos no contexto histórico das HQs, mostrando para os alunos HQs que falam sobre a história da África, de forma que os alunos acharam interessante essa forma dinâmica e interativa, já que a partir dos conhecimentos prévios sobre o assunto fornecido em sala, sobre a temática, os alunos foram capazes de relacionar aquilo que estavam vendo e lendo nos quadrinhos, com aquilo que aprenderam em sala.

A partir das HQs sobre África, os alunos puderam observar, de forma mais ampla e dinâmica, a história do povo africano, suas culturas, crenças e até mesmo observar como era feita a representação das divindades religiosas africanas, do ponto de vista dos quadrinhos. Como mostra as figuras abaixo retiradas da HQ “Conto dos Orixás.”

 
                                                Figura 1- Cena da HQ tal de Hugo Canuto.
 
                                                Figura 2 – Cena da HQ de Hugo Canuto.

Após abordar quadrinhos sobre África, fizemos uso também de outros quadrinhos como forma de evidenciar que mesmo se tratando de algo fictício, conta com a realidade social. Os quadrinhos do super-herói Pantera Negra, por exemplo, demonstra de forma mítica, a cultura africana. Logicamente por ser algo abordado em ficção, pode não corresponder totalmente com a realidade da história africana, mas ao ser elaborado essa HQ, toma-se como base pesquisas sobre África e a sua cultura.

Aplicamos igualmente, o uso de gibis sobre o tema. Gibis são uma espécie de HQs, mas especialmente focadas no publico infanto-juvenil. Os gibis foram utilizados de forma a fornecer um olhar menos elaborado sobre a temática, mas ao mesmo tempo, abordado de forma mais ampla, comparado com apenas a leitura do livro didático escolar. Como evidenciado nas figuras abaixo.

 
                                                    Figura 3 – Gibi de Zonatto Celso (1996)

Após essa pesquisa feita de forma informal com os alunos, não elaborando um método de recolha de dados específicos, foi possível perceber uma maior participação dos alunos em sala, eles se comunicavam mais sobre o que estavam aprendendo, detalhando que ainda se divertiam ao adquirir conhecimento por um objeto que consideravam de apenas para lazer e que não serviria de uso para obter compreensão histórica.

Posteriormente a essa experiencia em sala, elaboramos uma entrevista semiestruturada para ser feita com o docente preceptor desta escola. Aqui o chamaremos o professor de Roberto Claudio, 44 anos de idade, formado em História pela Universidade Federal do Piauí (UFPI) em 1998 e que nesta instituição leciona nas 1ª e 3ª série do ensino médio, totalizando sete turmas este ano.

O professor normalmente utiliza em sala de aula os recursos: Quadro, pincel, livro didático base, revistas, filmes, documentários, data shows, caixa de som (música). A sua opinião sobre o uso de histórias em quadrinhos como recurso pedagógico nas aulas de história é que para ele é considerado um bom recurso, pois segundo ele, torna-se o ensino-aprendizado mais atrativo por conta do uso de personagens e a utilização, na maioria dos casos, de uma linguagem simples e direta e que seria de fácil compreensão dos alunos.

Sobre o questionamento sobre quais assuntos as HQs podem ser trabalhadas em sala de aula, o professor Roberto Claudio acredita que se pode trabalhar em sala com o uso desse recurso, podendo abordar assuntos relacionados diretamente a questões políticas, religiosas, econômicas e culturais, um recurso dinâmico de serem trabalhados em razão das mais variadas visões e interesses que despertam, como por exemplo, o quadrinho “Foices e Facões” OLIVEIRA; AURÉLIO (2018) que narra o desenrolar da batalha do jenipapo, confronto da Independência do Brasil ocorrido em 1823 em Campo Maior no Estado do Piauí.


 
                                                    Figura 4 – Capa da HQ “Foices & Facões”



A partir destes questionamentos, perguntamos ao professor Roberto Claudio como ele planejaria uma aula, contando com os quadrinhos como um recurso didático e quais passos ele iria seguir para fazer um bom e efetivo uso deste mecanismo educacional. O professor relata que o uso das HQs em sala começa, primeiramente, com a escolha do tema a ser abordado em sala, para a partir disso, pesquisar HQs sobre o assunto. Após isso, seria necessário avaliar se os textos dos quadrinhos e as expressões das personagens condizem com a abordagem e com os objetivos pretendidos, além de buscar a história da criação das HQs escolhido para entender o viés que o quadrinho foi escrito e como isso pode influenciar na abordagem do mesmo em sala de aula.

4. Possibilidades e limites dos Quadrinhos como recuso didático nas aulas de história.

Sobre as possibilidades do uso dos quadrinhos como recurso didático nas aulas de história, é importante ressaltar que a presença das HQs fornece novos desafios aos professores, retratando a necessidade de uma maior percepção das formas de linguagem, como também a vasta variedade das obras disponíveis sobre o assunto e sobre como ele pode se tornar uma ferramenta didática. Tanto que o artigo discute a inserção das HQs no ambiente escolar, apresentando-o como uma sugestão de auxílio didático.

Vergueiro (2005) considera que: as HQs aumentam a motivação dos estudantes para o conteúdo das aulas, desafiando seu senso crítico; as HQs versam sobre os mais diferentes temas, sendo facilmente aplicáveis em qualquer área, além de apresentarem uma linguagem mais assimilável; a inclusão dos quadrinhos na sala de aula possibilita ao estudante ampliar seu leque de meios de comunicação, incorporando a linguagem gráfica à linguagem oral e escrita, que normalmente utiliza; os quadrinhos auxiliam no desenvolvimento do hábito de leitura; os quadrinhos enriquecem o vocabulário dos estudantes; o caráter elíptico da linguagem dos quadrinhos obriga o leitor a pensar e imaginar, tornando as HQs especialmente úteis para exercícios de compreensão de leitura e como fontes para estimular os métodos de análise e síntese de mensagens; os quadrinhos têm caráter globalizador, trazem temáticas que têm condições de ser compreendidas sem necessidade de um conhecimento prévio específico ou da familiaridade com o tema; os quadrinhos podem ser utilizados em qualquer nível escolar e com qualquer tema.

Sobre esse tópico, destaca-se o texto “Os Quadrinhos na aula de História” de Vilela (2014). Vilela levanta diferentes maneiras ou enfoques para a utilização das HQs no ensino de História, sendo elas: o uso para ilustrar ou demonstrar uma ideia de aspectos da vida social de comunidades do passado; para serem lidos e estudados como registros da época em que foram produzidos; para serem utilizados como ponto de partida de discussões de conceitos importantes para a História. Disso podemos entender que o uso das HQs em sala de aula, consiste em algo muito mais complexo do que apenas “mostrar” os quadrinhos para os alunos.

Em outro momento do texto, Vilela (2014) destaca que apesar de suas especificidades, as HQs também podem ser problematizadas a partir de critérios utilizados para outros documentos. Com base nisso, passa-se a ser levantadas algumas interrogações como: quem são os autores? Quando e onde foi produzida? Por quem fala? A quem se destina? Qual é a sua finalidade? Do mesmo modo, o autor lembra que muitas histórias em quadrinhos colocam o historiador em contato com o problema da memória – especialmente no caso das obras autobiográficas –, do anacronismo e da verossimilhança, elementos recorrentes na prática historiográfica.

Como visto, as HQs contribuem para a identificação de aspectos da vida social de comunidades do passado, permitindo ao professor partir dessas representações a fim de explorar o período antigo em sala de aula. Esses elementos colocam-se em evidência desde o momento da escolha do tema dos quadrinhos a serem escolhidos como instrumento educacional, sendo que baseado nisso, é necessário observar outras formas de discutir esta obra e como será feita essa discussão.

Reforça-se ainda, a necessidade de problematizarmos a questão do ensino de História levar em consideração a historicidade do discurso presente na HQ, pois mesmo se tratando de algo ficcional, pode estar relacionado com acontecimentos reais do cotidiano em que foi escrito.

As contribuições das histórias em quadrinhos são inúmeras, mostrando-se uma forma de aproximar o estudante de uma temática chave da constituição do mundo estudado em sala de aula, de forma que é mais compreendida por eles. O aluno terá contato, tomando como exemplo o quadrinho utilizado sobre África “Conto dos Orixás”, uma cuidadosa representação da cultura africana e das figuras religiosa, demonstração de elementos que desenvolveram o continente africano, além de ler sobre o desenvolvimento desse continente até se transformar no que é hoje. No entanto, é dever do historiador, problematizar a construção destas narrativas históricas presentes na HQs.

Detalhamos que os quadrinhos possuem em sua narrativa, um envolvimento de uma estrutura diferente dos livros de História tradicionais. Apesar de se utilizar uma HQ de qualidade, com clara pesquisa dos elementos históricos abordados e criados sob perspectiva educacional, esses mesmos fatores reforçam a necessidade de o professor atuar como mediador no trabalho com essa linguagem, problematizando o discurso histórico presente na HQ. 

Cabe ao profissional que escolhe trabalhar com esse texto levar em consideração as diferentes histórias possíveis sobre os processos de surgimento e desenvolvimento da temática a ser abordada, mostrando aos alunos a versão desses acontecimentos contados pelas histórias em quadrinhos.

5. Considerações finais.

O ambiente escolar precisa evoluir a maneira que o mundo evolui em seu espaço social, tecnologias, formas de obter conhecimento entre outros, o enquadramento escolar aprisiona e não torna o conhecimento prazeroso e por vezes sem utilidade. Trazer métodos e formatos de aula aliado a algo que estar dentro do contexto do mundo do aluno, é uma possibilidade a se seguir. Sendo assim, as HQs serviriam como estimulador da leitura entre os alunos correlacionando com a compreensão da realidade social em que vivem. As HQs é um meio de alfabetização e de leitura saudável, alfabetizar visualmente. 

No ambiente escolar é interessante que o docente traga os conteúdos complexos ou não, de forma lúdica e descontraída. As HQs constituem de um instrumento que está presente no cotidiano das crianças e jovens, como uma leitura popular. E desta forma o uso delas aproxima os alunos no exercício da atividade. Histórias em quadrinhos é uma forma de auto-expressão, quadrinhos é arte. A arte é a maneira de nos afirmamos enquanto indivíduos. E isto é bastante significativo para nossos estímulos externos e sobrevivência mental.

6. Referências

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
LIMA, D. M. X. de.Histórias em quadrinhos e ensino de História. In: Revista História Hoje, v. 6, nº 11, p. 147-171, 2017.
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